Associação Portuguesa de Investigação em Cancro
Tromboprofilaxia em Doentes Oncológicos em Portugal: Estudo de Vida Real
Tromboprofilaxia em Doentes Oncológicos em Portugal: Estudo de Vida Real
O tromboembolismo venoso (TEV) afeta até 20% dos doentes com cancro, apresentando um risco quatro a sete vezes superior ao da população geral. Este risco elevado é atribuído a fatores relacionados com o paciente, tumor e tratamentos. Na decisão sobre a tromboprofilaxia primária, estes fatores, juntamente com o potencial para hemorragia e impacto na qualidade de vida do paciente, são considerados. Ao longo dos anos, vários modelos de avaliação de risco para trombose associada ao cancro foram desenvolvidos para auxiliar na seleção de doentes oncológicos em ambulatório para tromboprofilaxia primária e melhorar a estratificação de risco e os resultados. Apesar destes avanços, permanecem controvérsias e a instituição de tromboprofilaxia primária não é consensual apesar das guidelines internacionais. A melhor caracterização dos doentes sob tromboprofilaxia e conhecimento dos fatores de risco para eventos trombóticos e hemorrágicos é crucial.
Foi realizado um estudo pioneiro em Portugal, apoiado por uma bolsa de investigação do Grupo de Estudos de Cancro e Trombose, de dados de vida real, multicêntrico, sobre tromboprofilaxia primaria em doentes com cancro em ambulatório, que analisou 124 pacientes adultos com tumores sólidos. Foi avaliada a medicação e duração usada para a tromboprofilaxia, os eventos trombóticos (localização e sintomas) e hemorrágicos e a progressão da doença oncológica e mortalidade. O grupo de participantes consistiu principalmente em indivíduos idosos com múltiplas comorbidades, equilibrados em termos de género, mantendo um bom performance status e Índice de massa corporal, predominantemente com cancro pancreático e gástrico em estádios avançados.
Os eventos trombóticos ocorreram em 11%, sendo predominantemente venosos e sintomáticos. A importância de manter a tromboprofilaxia primária por pelo menos seis meses com monitorização contínua até a conclusão é destacada pela observação de que os eventos trombóticos ocorreram por volta do 6º mês de tromboprofilaxia. Em relação aos eventos hemorrágicos, estes ocorreram apenas em 9%, a maioria classificados como minor. A tromboprofilaxia demonstrou ser eficaz e segura, com 81% dos pacientes sem eventos trombóticos nem hemorrágicos. Foi reportada uma associação entre fatores de risco conhecidos, como compressão vascular, níveis elevados de D-dímeros e história prévia de TEV e a ocorrência de trombose, mostrando a relação entre tumor e trombo-inflamação. Estes resultados identificam um subgrupo de risco muito elevado para trombose, mesmo sob tromboprofilaxia, que beneficiaria de estratégias de profilaxia mais personalizadas.
Os resultados deste estudo fornecem os primeiros dados de vida real em Portugal sobre a tromboprofilaxia primária em doentes oncológicos ambulatoriais. Estes resultados suportam o uso da tromboprofilaxia primária em pacientes com risco médio a alto, uma vez que a grande maioria dos pacientes não experienciou eventos de TEV nem hemorrágicos. O estudo revela a necessidade de estratégias de tromboprofilaxia primária mais personalizadas. Destaca a urgência de definir a duração e dosagem ideais da profilaxia e de avaliar o impacto na qualidade de vida dos doentes. Evidencia também a importância de analisar a adesão às guidelines internacionais e identificar desafios na sua implementação, bem como de descobrir novos fatores preditivos para trombose e hemorragia. Mais investigação na área da trombose associada a cancro é crucial para otimizar a prevenção e melhorar a qualidade de vida dos doentes.
Autores e Afiliações:
Joana Liz-Pimenta 1 2, Valéria Tavares 2 3 4, João Gramaça 5, João Rato 6, Maria Menezes 7, Mafalda Baleiras 8, Helena Guedes 9, Joana Reis 10, Catarina Guedes 11, Rosa Gomes 1, Miguel Barbosa 10, Marta Sousa 1, Alok A Khorana 12, Rui Medeiros 13 14 15 16 17
1 Department of Medical Oncology, Hospital Center of Trás-Os-Montes E Alto Douro, 5000-508, Vila Real, Portugal.
2 Faculty of Medicine of University of Porto (FMUP), 4200-072, Porto, Portugal.
3 Molecular Oncology and Viral Pathology Group, Research Center of IPO Porto (CI-IPOP) / Pathology and Laboratory Medicine Dep., Clinical Pathology SV / RISE@CI-IPOP (Health Research Network), Portuguese Oncology Institute of Porto (IPO Porto) / Porto Comprehensive Cancer Center (Porto. CCC), 4200-072, Porto, Portugal.
4 ICBAS - Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar, Universidade Do Porto, Porto, Portugal.
5 Department of Medical Oncology, Hospital Center of Barreiro Montijo, 2830-003, Barreiro, Portugal.
6 Department of Medical Oncology, Hospital of Luz Setúbal, 2900-722, Setúbal, Portugal.
7 Department of Medical Oncology, Hospital of Espírito Santo de Évora, 7000-811, Évora, Portugal.
8 Department of Medical Oncology, Hospital Center of Lisboa Ocidental, 1449-005, Lisbon, Portugal.
9 Department of Medical Oncology, Hospital Center of Vila Nova de Gaia / Espinho, 4434-502, Vila Nova de Gaia, Portugal.
10 Department of Medical Oncology, University Hospital Center of São João, 4200-319, Porto, Portugal.
11 Department of Imunohemotherapy, Hospital of Senhora da Oliveira, 4835-044, Guimarães, Portugal.
12 Department of Hematology and Medical Oncology, Taussig Cancer Institute, Cleveland Clinic Foundation, Cleveland, OH, 44106, USA.
13 Faculty of Medicine of University of Porto (FMUP), 4200-072, Porto, Portugal.
14 Molecular Oncology and Viral Pathology Group, Research Center of IPO Porto (CI-IPOP) / Pathology and Laboratory Medicine Dep., Clinical Pathology SV / RISE@CI-IPOP (Health Research Network), Portuguese Oncology Institute of Porto (IPO Porto) / Porto Comprehensive Cancer Center (Porto. CCC), 4200-072, Porto, Portugal.
15 ICBAS - Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar, Universidade Do Porto, Porto, Portugal.
16 Research Department, Portuguese League Against Cancer - Regional Nucleus of the North, 4200-172, Porto, Portugal.
17 Biomedical Research Center, Faculty of Health Sciences of the Fernando Pessoa University, 4249-004, Porto, Portugal.
Abstract:
Introduction: Cancer-associated thrombosis (CAT) is a significant concern among patients with malignant diseases, leading to increased mortality. While current guidelines recommend primary thromboprophylaxis for venous thromboembolism (VTE) in medium-to-high-risk outpatients, this practice remains controversial. A better understanding of primary thromboprophylaxis is crucial, yet there is a lack of Real-World Evidence (RWE) in Portugal.
Aims: This RWE study aimed to elucidate primary thromboprophylaxis practices among cancer outpatients in Portugal.
Methods: A five-year observational multicentric study in eight Portuguese health institutions enrolled 124 adult cancer outpatients under primary thromboprophylaxis for VTE. The endpoints were CAT, bleeding, cancer progression and death.
Results: High thrombotic risk tumours were prevalent, with 57% (71) of the patients presenting with pancreatic and gastric cancers. Regarding primary thromboprophylaxis, 55% (68) received Low-Molecular-Weight Heparin (LMWH). VTE was presented in 11% (14) of the patients and major bleeding in 2% (2). Vascular compression, elevated D-dimer and previous VTE were significantly associated with VTE occurrence under primary thromboprophylaxis. The Onkotev model was shown to be the best risk assessment model (RAM) in this population (p = 0.007). CAT patients exhibited a lower progression-free survival than non-CAT patients (p = 0.021), while thrombosis did not influence overall survival (p = 0.542).
Conclusion: Primary thromboprophylaxis in medium-to-high-risk cancer outpatients is a safe and effective practice in real-world settings. This study is the first Portuguese RWE on primary thromboprophylaxis, highlighting evidence for improving prophylactic strategies in this population.
Revista: Journal of Thrombosis and Thrombolysis
Link: https://link.springer.com/article/10.1007/s11239-024-02984-1